A bibliotecária de Auschwitz - Antonio G. Iturbe

>>  segunda-feira, 4 de novembro de 2024

ITURBE, Antonio G.. A bibliotecária de Auschwitz. Rio de Janeiro: Editora HarperCollins Brasil, 2017. 368p. Título original: La Bibliotecaria de Auschwitz.

"A primeira lição que qualquer veterano dá a um recém-chegado é a de que sempre se deve ter claro seu objetivo: sobreviver. Sobreviver mais umas horas e assim acumular mais um dia, que somado a outros poderá se transformar em mais uma semana. E assim sucessivamente; nunca fazer grandes planos, nunca ter grandes objetivos, apenas  sobreviver a cada momento. Viver é um verbo que só se conjuga no presente." p.22

Não importa quantos livros eu já tenha lido sobre o holocausto, cada novo livro é uma porrada que a gente leva. Cada nova descrição, cada nova morte, é meu coração ficando partido novamente. Foi uma raça que tentaram dizimar, crianças, idosos, trabalhadores. Uma população inteira sobre o jugo do nazismo. Esse livro tem uma narrativa cruel que chega a machucar, ao lado de Dita e seus livros, passamos mais de um ano "vivendo" em Auschwitz.  E por incrível que possa parecer, essa é uma história mais de esperança, do que de dor. É uma história de luta e de fé. Baseada na história real de Dita Polachova, uma adolescente incrível! Confiram minha opinião sobre A bibliotecária de Auschwitz do espanhol Antônio G. Iturbe. 

Auschwitz-Birkenau, janeiro de 1944
Alfred Hirsch conseguiu o que ninguém nunca imaginaria, ele fundou um galpão familiar no meio do campo de concentração e abriu uma escola! Durante mais de um ano, 521 crianças estudaram ali, e ele conseguiu manter todas elas vivas. A escola era tolerada pelos dirigentes nazistas e servia a um propósito, mostrar que os campos eram lugares funcionais e que as pessoas só estavam ali até o fim da guerra. E, claro, tentar mascarar todo o horror que acontecia do outro lado do campo, com as câmaras de gás em pleno funcionamento. O bloco 31 era um dos 32 barracões que compunham o campo BIIb.

Alguns voluntários trabalhavam como professores e davam o seu melhor para ensinar aquelas crianças a ler, fazer contas, e principalmente, esquecer por algumas horas o horror em que viviam. Todos viviam por mais um dia, por mais um mês, todos lutavam para sobreviver e rezavam pelo fim da guerra, por uma derrota dos alemães. Com material escasso, pouca comida, em um ambiente totalmente insalubre as perdas eram muitas. Mas eles faziam de tudo para cuidar daquelas crianças.

Edita Adlerova, mais conhecida como Dita, tinha 14 anos quando foi escolhida para ser a "bibliotecária" da escola. Eles tinham escondidos sob o piso do quarto de Hirsch, 8 livros, alguns praticamente ilegíveis, mas todos muito bem cuidados e valorizados. Dita trata com carinho e cuidado cada um deles, emprestando para os professores, e recolhendo e escondendo tudo no final das aulas. Entre ficção, um atlas antigo e um livro de matemática desatualizado, estavam oito tesouros.  Com o passar do tempo ela também implanta na sua biblioteca os "livros vivos" que nada mais eram do que voluntários que leram e releram algum livro amado e que podiam contar a história inteira para as crianças. 

"Não era uma biblioteca extensa. Na verdade, era formada por oito livros, e alguns deles em mau estado. Mas eram livros. Naquele lugar tão escuro em que a humanidade chegou a alcançar a própria sombra, a presença dos livros era um vestígio de tempos menos lúgubres, mais benignos, quando as palavras ressoavam mais do que as metralhadoras. Uma época extinta." p.36

Dita era uma daquelas pessoas que amavam o mundo dos livros, que podia se esconder em uma latrina fétida, no meio de um campo de concentração lamacento, e esquecer de tudo nas páginas de um livro. Para ela, os livros nunca perdiam a memória, e podiam transformar um punhado de folhas em um mundo inteiro! 

Quando não estava no bloco 31, ela dormia em um bloco familiar com seus pais. Uma cama e um colchão infestado de insetos, era usado por 2, às vezes 3 pessoas. Seu pai trabalhava em uma oficina, e estava sofrendo com uma tosse recorrente. Sua mãe tinha um trabalho um pouco mais leve, mas também estava pele e osso. Na escola eles às vezes tinham um pouco mais do que uma sopa aguada, onde, com sorte, você podia encontrar um pedaço de batata. E o pouco que ela conseguia, dividia com os pais. Comida ali, valia ouro. E o mercado paralelo corria à solta. 

Três meses depois de chegar em Auschwitz eles enfrentam outra provação, quando veem todas as famílias que tinham completado seis meses no local, sendo enviadas juntas para as câmaras de gás. Foram quase 4.000 pessoas em uma única noite. No outro dia, os sobreviventes viram cair do céu, as cinzas dos companheiros. Enquanto tentavam sobreviver naquele inferno, eles encontravam forças e coragem em um pouco de normalidade e na fé, acreditando no final da guerra e na libertação dos judeus. Os aliados eram um sonho distante, e cada dia parecia durar um mês. A fome era constante, as doenças matavam quase tanto quanto as câmaras de gás. Incapazes de sonhar com um futuro melhor, eles tentavam apenas sobreviver, mais um dia, mais uma semana... 

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Que soco no estômago esse livro! Mesmo para quem, como eu, já leu diversos livros sobre o holocausto e já sofreu e chorou com Anne Frank (que inclusive é rapidamente citada no final do livro, quando está em uma cama junto com a irmã em Bergen Belsen), este é um livro devastador. Ao mesmo tempo que parte o coração, a esperança daquelas pessoas no meio daquele inferno, é um sopro de fé no meio de tudo aquilo.  

Como disse no início, a história é baseada na história real de Dita e sua pequena biblioteca. Algumas das pessoas que viveram ali e que sobreviveram, são citadas no final do livro, contando sobre a vida delas depois do final da guerra. Alguns nomes são trocados durante a narrativa e são informados também no final.  Eu achei o início lento e um pouco cansativo, algumas partes eram apenas descrições e descrições, e eu não senti a emoção daquelas páginas, de tanta tristeza compartilhada. Mas a parte final do livro é completamente envolvente, e me vi parando de ler em alguns momentos, para me recuperar. Como chorei no final desse livro, e até agora, quando escrevo este texto, algumas partes me emocionam. 

Para uma bibliotecária, como eu, ler sobre a importância dos livros e sua capacidade de mudar a vida das pessoas, é sempre um prazer. Ler sobre o poder dos livros, em meio a tanta tristeza, foi inimaginável.  E isso é o que difere essa história de tantas outras que abordam o mesmo tema. Às vezes parecia surreal! De um lado uma escola funcional, com as crianças cantando e desenhando, e do outro pessoas chegando todos os dias e sendo divididas em dois grupos: Os saudáveis que podiam trabalhar iam para os galpões, os considerados velhos, doentes ou inaptos, iam direto para as câmaras de gás. 

E depois da noite em que 3.792 pessoas, que moravam lá com eles, são informadas que serão transferidas e, são todas enviadas para a morte, Dita já imagina que o mesmo acontecerá com ela e os outros sobreviventes, quando completarem 6 meses no campo. Você torce para que aquelas pessoas sobrevivam, pensa que falta "só" um ano para a guerra acabar, mas cada dia parece durar um mês. E quando os nazistas sabem que vão perder, sabem que os aliados estão chegando, o que eles fazem é começar a matar pessoas mais rápido para terminar o plano de extermínio de Hitler. Outro fato que causa muita revolta é que o tal médico, Dr. Josef Mengele, o mais fdp entre tantos fdp, consegue fugir no final da guerra e acaba vindo morar no BRASIL! Que ódiooo que fiquei ao ler sobre isso.  

Bom, essa é uma história inestimável e inesquecível, que indico para todos. Mas não é um livro para todos os leitores, exige força e maturidade, mas espero que vocês leiam em algum momento da vida...

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Avaliação (1 a 5): 4.5

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