LARSEN, Nella. Identidade. Rio
de Janeiro: Harper Collins Brasil, 2020. 160p. Título original: Passing.
Aqueles que apreciam a leitura
normalmente descobrem primeiro o livro para depois tomar conhecimento de
adaptações cinematográficas ou televisivas. É raro, mas às vezes o oposto
acontece. Para mim, esse foi o caso de Identidade, livro da americana Nella
Larsen que descobri ao me deparar com o filme no catálogo da Netflix. Após ler
algumas críticas positivas sobre o filme, especialmente sobre a atuação das
protagonistas, fiquei curiosa e fui procurar mais detalhes da história. Nesse
momento descobri que se tratava da adaptação de um livro de 1929, que desde
então tratava temas raciais considerados polêmicos e sensíveis até hoje. O foco
é o colorismo, e como li recentemente “A Metade Perdida” de Brit Bennet (cuja
resenha vocês conferem AQUI), me interessei em saber mais sobre a história. Encontrei um livro com uma
linguagem simples, mas muito bonita. A autora faz uso de muitos adjetivos e uma
precisão admirável nos diálogos e nas descrições, o que me agradou. Uma leitura
fácil e agradável sempre é bem-vinda, ainda mais quando trata de temas
relevantes e capazes de deixar o leitor com a sensação de relevância e conhecimento
ao apresentar novas perspectivas sobre um assunto não tão tratado na literatura.
A história é contada pela ótica de Irene Redfield e trata do reencontro dela
com sua amiga de infância, Clare Kendry. As duas foram criadas no Harlem em
Nova York, mas seguiram caminhos opostos. Apresentadas como mulheres negras de
pele clara, cada uma tomou uma escolha diferente: Irene se casou com um homem
negro e tem uma vida estável e feliz com 2 filhos; Clare escolheu se passar
como branca, casando com um homem branco racista e extremista e escondendo seu
passado. O livro começa com Irene
recebendo uma carta de Clare, o que a faz relembrar da infância que as duas
compartilharam como crianças negras no Harlem e a forma com que perderam
contato, com Clare sendo levada para morar com duas tias brancas após a morte
do pai mestiço. Irene então descobre que Clare agora se “passa” por uma mulher branca,
vivendo um tempo na Europa com seu marido rico, conservador e racista e uma
filha. Irene tenta manter uma distância de Clare, mas a mulher é persistente e
não desiste de restabelecer a antiga amizade. Aos poucos, as duas vão se
conhecendo mais, trocando as aflições e comparando suas vidas nos dois mundos
próximos mas completamente distintos em que vivem. (Uso o termo PASSAR entre aspas
pois não encontrei um termo semelhante em português. O título original do livro
é Passing, que podemos traduzir como Passando-se, e remete a uma
prática encontrada por pessoas de cor com pele clara para se inserir na
sociedade como brancos. Isso era algo até comum na década de 1920 na região onde
o livro se passa e remete a experiências pessoais da autora. Nella Larsen era
filha de uma mulher branca com um homem negro e foi criada por um padrasto
dinamarquês. A cor de sua pele e a dificuldade que encontrava em se identificar
com uma raça específica certamente influenciou suas histórias e as duas
personagens centrais deste livro). Como a história é contada por
Irene, não temos uma visão complexa ou ao menos completa das angústias e razões
para as escolhas que Clare tomou na vida e no decorrer da história. Na verdade,
eu acho que esse livro fica em um limbo, algo entre um conto e uma história
longa completamente madura. Aqui acho que faltou uma escolha da autora: ou
encurtar mais as descrições e a história e se ater ao formato de conto, deixando
muito à imaginação ou dedução do leitor; ou nos dar mais descrições e desenvolver
um pouco mais os personagens. O que temos definitivamente é um bom material,
mas a sensação de que falta algo ficou comigo após a leitura. Mesmo assim é um
livro bom, necessário, inteligente e que trás uma perspectiva única da
experiência da autora. Vendo o recente sucesso de “A Metade Perdida” é inegável
a influência dessa história, e espero ler muitos outros livros com essa
temática complexa e ainda desconhecida para mim. Adicione ao seu Skoob! Compre na Amazon: Identidade Avaliação (1 a 5):
Blog literário criado exclusivamente para divulgação e incentivo à leitura por meio das resenhas dos livros lidos por mim, Fernanda, e pelas duas outras colunistas, Alice e Evelyn. O blog não tem nenhuma relação com o projeto de leitura intitulado "Viagem Literária".
"Livros não mudam o mundo. Quem muda o mundo são as pessoas. Livros só mudam as pessoas ." (Mario Quintana)