Moça com Brinco de Pérola – Tracy Chevalier
>> sexta-feira, 27 de agosto de 2021
CHEVALIER, Tracy. Moça com Brinco de Pérola. Rio de Janeiro: Editora Bertrand, 2002. 239p. Título original: Girl with a Pearl Earing.
Tendo essa imagem linda e
marcante como inspiração, a autora cria uma história sobre a vida particular de
Vermeer e o contexto que o leva a pintar a sua obra-prima. Mas não é apenas a
história do pintor que temos. Talvez a anônima mais famosa da história da arte,
a modelo do seu quarto também ganha vida como Griet, uma jovem de 16 anos que
tem que sair de casa e trabalhar para ajudar a sustentar sua família após um
acidente sofrido pelo pai. Como ele era pintor de azulejos e membro da guilda
dos artistas, a jovem consegue um emprego como empregada doméstica na casa de
Vermeer. Mas a situação não é tão simples assim: isso é considerado um declínio
social para a jovem, que vai de uma família artística para um dos trabalhos mais
desvalorizados naquela sociedade. Para piorar a situação, os Vermeer pertencem
à minoria católica, o que entra em contraste com a religião protestante da
moça.
O início da obra nos
mostra a adaptação de Griet, indo de uma vida confortável e tida como “honesta”,
por ser ela uma jovem protestante de família artística, para uma “desgraçada”
no momento em que ela aceita a posição: a doméstica suja, que presume-se dormir
com o patrão, prestando serviços em uma casa de uma religião tida como
inferior. Não é de se estranhar que ela sofre com esse início, mas vai se
adaptando para ganhar voz e força e se relacionar tanto com os serviçais (especialmente
Tanneke, a outra doméstica) quanto com a família. Ela faz amizade com a filha
mais velha da família, Maertge, mas nunca se dá bem com a rancorosa Cornelia, a
filha mais nova favorita da repudiante matriarca da família, Catharina. Aqui,
temos uma história nos típicos moldes da Gata Borralheira: a mocinha linda,
presa a trabalhos domésticos braçais, que sofre abusos da malvada “madrastra” e
das irmãs feias. Eu particularmente adoro esse enredo, especialmente pois já
espero muita juistiça e carma no final, então logo de cara já fui conquistada.
Então entramos na
segunda parte da história. Visitando sua casa apenas aos domingos, ela vê a
família aos poucos se desfazendo, especialmente quando sua irmã Agnes morre vítima
da peste. Cada vez mais ela se liga aos Vermeer e à vida que leva por lá,
inclusive mantendo uma amizade com pequenos toques de flerte com Pieter, filho
do açougueiro da família. Mas o que mais a liga àquela vida é a arte: Griet se
mostra cada vez mais uma ávida adimiradora do trabalho de seu patrão. Um dia,
Vermeer descobre o fascínio da menina pela arte e rapidamente percebe que ela
possui um dom. Então, ele resolve secretamente e discretamente a ensinar um
pouco mais sobre pintura, transformando suas tarefas domésticas em atividades
de um aprendiz, como misturar a pintura e preparar os cenários. Como a moça
acaba passando cada vez mais tempo no ateliê do pintor, Catharina, a esposa
malvada, começa a suspeitar que os dois têm um caso.
E então a terceira
parte em muito se relaciona com a arte e a confecção do quadro, habilmente
ligando todas suas partes. O que mais me marca sobre a maneira como a autora
executou sua narrativa é como a simplicidade é a característica marcante. Ela
não precisa de muitas palavras para expressar exatamente o que quer, para dar a
entender diversas situações ou pensamentos. É uma sutileza que eu acho difícil
de executar, e ela o faz com maestria. Esse livro para mim foi um excelente
cartão de visitas ao fantástico mundo de Chevalier, e depois dele encontrei
obras por quais sou apaixonada, e que espero um dia poder compartilhar com
vocês.
Tem tudo
para ser um livro 5 estrelas, certo? Sim, mas não é. Vou tentar explicar as
minhas razões, e muito disso passa pelo impacto que o filme deixou em mim.
Eu adorei o
filme quando assisti, mas muito mais pelos atores, pelo cenário histórico e pelo
desenvolvimento da história. Quando li o livro, percebi o quanto o filme foi
genial, pois ele foi capaz de identificar algumas falhas no enredo e as suprir.
Não estou falando de mudança na história, mas sim na ênfase em algumas
situações, sentimentos, olhares, cores. Eu li o livro e já de cara pensei: o
filme acertou, essa história precisava de um pouco mais de volume, de falar um
pouco mais alto em alguns casos, em talvez em algum momento deixar algo mais
explícito. E, para mim, temos um raro exemplar de um filme que é melhor que o
livro.
Eu adorei o
livro e acho uma leitura muito legal para os fãs de ficção histórica, rápido e
fácil de ler. Mas ele poderia ser ainda melhor se explorasse mais o romance e se
desse ainda mais os tons da Gata Borralheira que mencionei no início. Talvez
seja uma questão de experiência da autora, pois eu gostei muito mais de livros
posteriores dela, que souberem explorar mais a química entre as personagens.
Mas mesmo assim acho um livro inovador, criativo, bem escrito, fácil de ler e
que merece ser lido. E ouso aqui sugerir para vocês um inusitado: assistam o
filme primeiro!
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Avaliação (1 a 5):