Daqui pra baixo - Jason Reynolds

>>  segunda-feira, 8 de junho de 2020

REYNOLDS, Jason. Daqui pra baixo. Rio de Janeiro: Editora Intrínseca, 2019. 320 p. Título original: Long way down.

Violência. Segundo o dicionário Caldas Aulete Digital “Emprego abusivo, ger. Ilegítimo da força ou da coação com o fim de obter algo.” Mas a pergunta que me faço é: obter o quê? Temos visto pela TV e pela internet, há dias, notícias e mais notícias de protestos antirracistas praticados nos Estados Unidos e no mundo depois do que aconteceu com George Floyd, no dia 25 de maio, em Minneapolis. E, infelizmente, ele é apenas um de milhares e milhares de negros e de pessoas, no mundo inteiro, vítimas de atitudes racistas e violentas, praticadas (para quê?) por outras milhares e milhares de pessoas. Pensando nisso, recebi a proposta da Editora Intrínseca para trazer até você, jovem leitor, um livro que nos traz exatamente esta mensagem: em um mundo tão violento, praticar mais violência para quê? Qual a razão? Quais as consequências? Se você se faz essa pergunta constantemente, ou se acha que tem se perguntado de menos, venha dar uma conferida em Daqui pra baixo.

Will tem 15 anos e acabou de perder irmão mais velho, Shawn, para a violência. Mais um membro da família perdido. Pobre, morador da periferia, Will já aprendeu as três leis mais importantes do ciclo em que vive:

1 – Não chorar, nunca, não importa o que aconteça.
2 – Não dedurar, nunca, não importa o que aconteça.
3 – Se fizerem alguma coisa com você ou com um dos seus, vingue-se.

É isso que ele tem em mente quando decide pegar, escondido, a arma que era de seu irmão e ir atrás da pessoa que ele tem certeza que matou Shawn.

E, em 67 segundos, enquanto está no elevador indo cumprir a missão que deu a si mesmo, ele encontra, a cada andar, alguém que lhe trará uma história sobre a vida e sobre a violência e como esta afetou a vida de quem está contando. Ao final do curto trajeto, Will não só terá decidido se vai mesmo colocar a terceira regra em prática, como estará mudado para sempre.


                                                                                              SERÁ QUE DÁ
pra um só abraço
regenerar a pele
do tempo,
cada pedaço
cascudo e calejado,
as partes secas
irritadas e
irritantes, 
e tudo que sangra?
 p.207

A Intrínseca não estava de brincadeira quando disse que eu ia “devorar” o livro e que ele ia me “devorar”. Não tem como não sair totalmente mudado desta leitura. Feita em versos, “devorei” cada página sem tomar fôlego para a próxima e terminei a leitura (pasmem, 320 páginas) em cerca de 60 minutos, totalmente sem ar e totalmente “devorada” pela história. Acho que vou passar um bom tempo digerindo tudo.

A escrita é muito simples, o que contribui muito para a leitura rápida.

Will conquista o leitor logo nas primeiras páginas, de modo que passei a torcer para que ele, nos fim das contas e apesar de tudo, não levasse a terceira regra ao pé da letra e gerasse mais violência, que acabaria por mudar sua vida de forma negativa para sempre, como também poderia culminar no fim de sua vida.

Apesar de estar exposto a todo tipo de mau exemplo na periferia em que mora, com poucas oportunidades de uma vida melhor para as pessoas dali, vemos que há uma tentativa de viver normalmente, falar sobre garotas, sobre música, brincar com o amigo no parquinho, longe das drogas, das gangues. Mas a segregação social e racial, assim como a violência que permeia e impregna tudo, sempre acaba por prevalecer e mudar a vida das pessoas.

Alguns elementos ao longo do livro me chamaram atenção e os entendi como metáforas, como a fumaça produzida pelos cigarros das pessoas que estavam no elevador com Will, que para mim significam a fumaça da raiva, do ódio por quem matou Shawn e que estavam nublando a mente de Will, seus pensamentos, seus sentimentos, moldando as atitudes que ele queria ter.

Também o sentido da expressão que dá título ao livro, “daqui pra baixo”, tanto se aplica, na minha opinião, à direção do elevador, que estava descendo, quanto às consequências do ato que Will estava prestes a cometer, os quais, com certeza, o levariam para a decadência. A expressão também remete à direção do texto propriamente dito, escrito em versos; a partir do começo da leitura, dali pra baixo o leitor “devoraria” o livro (e numa velocidade alucinante, diga-se de passagem).

Um terceiro elemento que me chamou atenção: a noite. Mas em um sentido negativo, um lado sombrio que rouba tudo da pessoa. A noite, no contexto da história, pode ser considerada como sendo a violência também. O próprio texto nos diz: "coloca uma arma na mão, um ronco na barriga e até os dentes a noite afia.”

Outra coisa interessante é a questão do tempo: há uma indicação das horas na páginas, a partir do momento em que Will entra no elevador. Esse detalhe pode passar despercebido por alguns, mas, ao ser observado, fica claro que a maior parte da história se passa, cronologicamente, em pouco mais de 1 minuto. Porém, como o leitor tem acesso ao psicológico do protagonista, esse tempo parece muito mais longo e demorado.

Enfim, a mensagem que o livro me trouxe foi a de que a violência leva a um caminho claro: mais violência. É uma temática muito importante e atemporal, e não pode ser deixada de lado. Assim como as ações antirracistas devem ser atemporais e fazer parte do cotidiano das pessoas, na busca da igualdade/paridade racial. Assim como a luta pelas demais causas também tem que se fazer prevalecer até que não seja mais necessário lutar diariamente por isso.

Leiam este livro!

Adicione ao Skoob!


Avaliação (1 a 5): 







Comente, preencha o formulário, e concorra ao Kit Top Comentarista de JUNHO!

Postar um comentário

  © Viagem Literária - Blogger Template by EMPORIUM DIGITAL

TOPO