Nada normal
>> segunda-feira, 4 de abril de 2011
Fenômenos que parecem desafiar as leis da natureza intrigam a humanidade há séculos. Todo mundo, em algum momento da vida, desejou ter algum poder paranormal, sobrenatural ou oculto como Jonh , em “Eu sou o número quatro”.
Eu, poderia escolher alguns: visão de raio-X, para saber o que rola atrás daquela porta, sopro congelante, para aquele colega mala do trabalho, telepatia, para saber o que realmente pensa aquela pessoa, viagem transtemporal, para viver os melhores momentos da história ou consertar aquela burrada, teletransporte, para nunca mais chegar atrasada ou ter que passar horas no trânsito caótico, invisibilidade, para enfim, poder tomar aquele chá de sumiço.
Aqui, na vida real, nós aprendemos a desenvolver habilidades, que, se não são classificadas como paranormais, são, no mínimo, “nadanormais”. Essas habilidades nos ajudam a lidar melhor com a vida. Eu, por exemplo, falo sozinha. Não enxergo vultos ou personagens que gesticulam saudosamente. Esta é outra habilidade, a da pessoa que passeia para fora. E estou falando de outra viagem, de quem passeia para dentro.
Aprendi muito nova. E criança ainda, quando minha mãe me pegava pelos cantos naquele papo-cabeça comigo mesma, eu fingia que estava cantando. Ainda hoje é assim. Outro dia estava no carro, numa conversa tensa sobre a ética dos jornais na cobertura de protestos trabalhistas, quando percebi que o motorista ao lado me olhava meio assustado. Encabulada, comecei a batucar no volante e balançar a cabeça, num ritmo assim meio sem graça.
Essa habilidade “nadanormal” já rendeu outras situações embaraçosas. Em uma delas, meu marido, ao chegar em casa e ouvir uma conversa entusiasmada, achou que tinha alguém escondido embaixo da cama ou dentro do guarda-roupa.
É diferente essa conversa de quem se esgalha por onde tem suas raízes, num malabarismo de tempos e espaços. Não são apenas conversas existências. São discussões, muitas vezes acaloradas, sobre todos os assuntos, com duas pessoas, que convivem aqui, dentro de mim.
Na vida, essas duas são uma só, claro. Ou ainda.
Mais que articular espelhos, é desvelar e construir um crescente mundo suplementar. E eu adoro esse voo solo. Gosto tanto do meu papo, que Narciso ficaria com vergonha.