A filha primitiva - Vanessa Passos
>> quarta-feira, 27 de abril de 2022
Um livro de 97 páginas pode parecer para muitos leitores uma leitura rápida, fácil, mas por outro lado, rasa. Engana-se quem pensar isso de A filha primitiva e eu já te explico porque.
Mãe, filha e neta vivem na mesma casa. A mãe cuida da neta, que não é exatamente objeto do mais profundo amor da mãe, que trabalha até mais do que deveria para ficar longe da filha e cujo único afeto que se permite dar é o aleitamento materno.
A filha quer saber quem é seu pai, mas a mãe insiste em não contar. A mãe quer saber quem é o pai da neta, mas a filha apenas diz que é alguém inútil, não importa.
E é nesse contexto de uma família sem nome e sem passado, que vamos acompanhar a busca incansável por nomes e motivos para, quem sabe, se libertarem da curiosidade, dar uma "cara" ao passado e poder viverem uma vida em paz.
A filha é professora de português/literatura, além de querer ser escritora. É o melhor meio que ela encontra de colocar pra fora tudo que a oprime, que a incomoda, que a machuca. Não nasceu para ser mãe e, de início, parece não ter o menor amor por sua filha, o que parece mudar pelo menos um pouco ao longo da história. Parece.
"Agora me dei conta: a chegada da menina me engravidou de novas palavras. Fico pensando que escrever é um parto infinito. A gente vai parindo devagarzinho, letra por letra, que se não saem ficam encruadas dentro, fazendo mal, ferindo a gente feito felpa que entra no dedo. Tem que tirar com agulha, espremer o pus. Dói parir palavras. Dói mais ainda viver com elas dentro." Posição 328
Não é possível dizer muito sem revelar muito sobre a história, então me limito a dizer que vocês podem se preparar para aproximadamente 2 horas de muito tapa na cara e soco no estômago, metaforicamente falando, rs.
É que, apesar de uma história bem curta, já que são só 97 páginas, e ser muito fluida a leitura, não é nada fácil e vai ser tudo, menos rasa.
A autora aborda assuntos como maternidade, abuso sexual, preconceito racial de uma forma crua, real, sem papas na língua e sem romantização.
Me senti profundamente abalada com as descrições sobre o parto e as cenas de abuso. Apesar de, graças a Deus, nunca ter passado por um abuso, é impossível não se colocar no lugar das personagens. É tudo quase palpável. Me senti quase parindo de novo, rs.
Após a conclusão da leitura ficou fácil entender porque o livro foi vencedor da sexta edição do Prêmio Kindle, foi muito merecido!
A filha primitiva é um livro necessário para todos os leitores, mulheres ou não, mães ou não, negras ou não. Leiam!
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