A segunda vida de Missy - Beth Morrey

>>  segunda-feira, 8 de fevereiro de 2021

 


MORREY, Beth. A segunda vida de Missy. Rio de Janeiro: Editora Intrínseca, 2020. 304p. Título original: Saving Missy.

"Havia momentos em que a solidão era esmagadora. Não apenas a solidão óbvia de morar sozinha em uma casa enorme, longe dos entes queridos, mas também um isolamento mais abstrato, galáctico, como um barco com o casco furado boiando em mar aberto, sem âncora nem terra à vista. Eu poderia afundar ou flutuar para mais e mais longe, e não sabia ao certo qual dos dois era pior." p.44

Quando eu li A troca eu comentei sobre como é importante livros que abordam a vida na terceira idade. É um tema importante, que precisa ser mais falado, precisamos refletir sobre ele. Existe um preconceito arraigado e muito pouco explorado; nós não valorizamos os nossos idosos! A sociedade exclui naturalmente os mais velhos do mercado de trabalho, do mercado de consumo e da vida social. Infelizmente os idosos muitas vezes sentem que "não servem para mais nada". E isso é tão triste e tão ridículo!!  Enfim, foi com alegria que eu comecei a ler um livro todo sobre isso! Confiram o que achei de A segunda vida de Missy da Beth Morrey.

Millicente Carmichael, mais conhecida como Missy, 79 anos, sente que sua vida chegou ao fim de um longo túnel, sem que ela consiga sair dele. Ela abandonou a carreira ao se casar, depois virou dona de casa e mãe em tempo integral. Viveu uma vida que ela considerava pouco satisfatória, criando dois filhos e cuidando do marido, um importante acadêmico.  Agora o marido não está mais ao seu lado, os filhos cresceram e foram viver sua vida. E ela está sozinha, em uma casa enorme e vazia. Esperando... o que exatamente? Ela passa seus dias bebendo mais do que deveria e lendo os esporádicos e-mails do filho mais novo.

Alistair se mudou para a Austrália com a esposa e o filho de 5 anos, Arthur, o neto amado de Missy. Ele visita a mãe uma vez por ano, no Natal, e no resto do tempo envia e-mails. Sua filha mais velha, Melanie, vive em Cambridge com a esposa e quase não tem contato com a mãe, depois de uma briga enorme que tiveram e ambas falaram coisas de que se arrependem. Ela não tem outros parentes, não tem amigos porque todas as suas amizades estavam ligadas ao marido, ela não tem um hobby... nada. São dias e dias repletos de horas vazias.

Quando alguém se aproxima dela de forma gentil, ela sempre se sente inconveniente, uma caridade para a velhinha solitária. Ela nunca consegue perceber se está sendo bem vinda ou um estorvo. Até que ela faz amizade com uma estranha no parque, por acaso, e sua vida começa a mudar. De repente a solitária e introspectiva Missy começa a ter uma vida social! Aos poucos ela faz amigos, arruma uma cachorra que ela não queria, fedorenta, chamada Bob. Serve de babá esporadicamente para Angela, cuidando de seu filho Otis, uma criança fofa de 5 anos. Conhece Sylvie, uma senhora gentil que é decoradora e se encanta pela casa antiga de Missy. E faz amizade com o grupo de cuidadores de cachorros do parque.  

Agora Missy tem uma cachorra amada! Vários amigos e algumas novidades para contar para o filho por e-mail. Ela está cercada de vida, de alegrias e começa a enxergar uma nova razão para viver.   

Um retrato emocionante da vida adulta e do envelhecimento. Um livro que fala sobre perdão, sobre novas chances e sobre a importância das pessoas. E de como é possível recomeçar, em qualquer idade. 

"Eu continuava sem ter muito sobre o que escrever para Alistair, porém ao menos tinha sido convidada para um café e aceitado, de certa maneira. Um passinho de cada vez. Passos de velha. Mesmo que eu não soubesse muito bem para onde estava indo." p.28

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Faz muito tempo desde que um livro despretensioso como este, não me emocionava tanto! A história de Missy é linda, triste, mas principalmente, importante. Já passou da hora de olharmos mais atentamente para os nossos idosos! A impressão que muitas vezes se passa é que uma pessoa nessa idade está apenas esperando a sua hora. E são pessoas que ainda têm tanto para viver, tanto para contribuir! Eles precisam ser enxergados como mais do que pais, avós, velhos... Missy me deixou com o coração partido do início ao fim do livro, são várias questões importantes que são levantadas no decorrer da história.

O livro é narrado em primeira pessoa por Missy, acompanhamos tudo pelos seus olhos. E ela é uma mulher calada, introspectiva. Temos a impressão de que Missy demonstra muito pouco seus sentimentos e ao longo da vida pode ter sido fria com o marido e os filhos. Os personagens secundários não são tão bem desenvolvidos, mas não vi isso como uma falha. Era a história sendo contada pela visão dela, como ela enxergava o marido, os filhos, os novos amigos.  É Missy contando a sua história, a história de uma mulher simples, muito humana, com todos os seus erros e falhas.   

Este não é um livro dinâmico, cheio de reviravoltas e "plots twists". Missy não é uma velhinha fofa e amável. É uma história muito real, eu só digo isso para vocês lerem com as expectativas certas!

A narrativa se alterna entre Missy no presente, com trechos do passado. Ela ainda jovem, o início do casamento. Fala sobre um aborto que ela nunca superou e nem se perdoou. Da depressão pós parto após o nascimento da filha, algo que naquela época era apenas ignorado; mas que prejudicou para sempre a sua relação com a filha. Da sua relação com o marido, o amor da sua vida, mas para quem ela nunca se declarou de verdade. 

Missy abandonou sua carreira como bibliotecária/arquivista para virar dona de casa em tempo integral, o marido não gostava que ela trabalhasse fora... Mesmo estando ausente a maioria do tempo com muitas viagens ou trancado no escritório. Leo falava que "gostava de tê-la por perto". Ela se arrepende de ter tido uma vida tão "vazia", apenas criando filhos e cuidando da casa, estando sempre disponível. Naquela época seus dias eram atribulados com as tarefas todas do dia a dia. Hoje ela enxerga o quanto seria importante ela ter exercido sua profissão. Ela está velha, não tem dinheiro, não tem emprego e nem amigos. Falta a Missy um objetivo. O livro traz esta reflexão importante para as mulheres que abrem mão de suas carreiras para cuidar da casa.

A solidão de Missy partiu meu coração. Por um lado, dá para entender o comportamento dos filhos, eles são adultos, casados, têm sua vida e suas responsabilidades. Acaba que na correria do dia a dia, eles não têm tanto tempo para dedicar a mãe, que mora em outra cidade, ou no caso do filho, em outro país. Já por outro lado, eu me irritei com a apatia dos dois. De como eles não tentavam estar mais presentes, telefonar mais, verificar se a mãe precisava de ajuda financeira, nada! Os dois conseguem esquecer o aniversário dela! Eu chorei de soluçar na parte em que o filho desmarca uma visita e ela fica desolada. Outro aspecto abordado no livro, a importância da amizade! Como uma rede de amigos é importante para termos com quem conversar, com quem se divertir ou apenas a companhia de outras pessoas no dia a dia.  

A narrativa é lenta em alguns momentos, mas não chegou a me cansar, a história me envolveu demais! Alguns podem considerar a narrativa monótona, mas acredito ser exatamente o que a autora quis passar. Achei que alguns dramas foram exagerados, a protagonista já estava miserável, não precisava de tudo aquilo rs. Mas serviu para eu chorar mais um pouco kkk. O final foi lindo, emocionante! Eu amei a forma tão sensível que a autora usou para abordar tantos temas pesados.  E para quem curte cachorros, Bob é uma personagem importante e muito amorzinho, amei tudo ligado aos pets. 

Este é o livro de estreia da autora e com uma narrativa linda dessas, ela promete muito mais pela frente!! Eu não curti muito a tradução do título, acho que não representa bem o que a história quer passar, mas por outro lado, adorei a capa!   

Como eu disse antes, esta é uma leitura IMPORTANTE para todos! Uma leitura sensível que precisa ser lida com o coração aberto. Uma história repleta de falhas, erros, de coisas não ditas e de desesperança. Uma história também repleta de amizade, segundas chances e muito amor. Uma história que mostra a importância de se estender a mão ao próximo, muitas vezes alguém desconhecido. Que livro lindo!! Se eu indico?! Parem tudo e vão ler agora!! Leiam!

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