A metade sombria - Stephen King
>> segunda-feira, 29 de abril de 2019
KING, Stephen. A metade sombria. Rio de
Janeiro: Editora Suma das Letras, 2019. 464p. Título original: The dark half.
“Que direito Beaumont tinha de ter filhos? De ter uma linda esposa? Que
direito Thad Beaumont tinha de viver na luz e ser feliz enquanto seu irmão
sombrio, que o tornou rico e famoso quando ele teria vivido pobre e morrido na
obscuridade, morria na escuridão como um vira-lata doente em um beco?” p.323
Já vou começar falando que essa coleção Biblioteca Stephen King foi a ideia mais
fantástica e bem executada que uma editora teve nos últimos anos. Edições
maravilhosas, com capa dura e conteúdo extra. Capa linda, tudo muito bem
trabalhado. Esse livro estava esgotado há anos no Brasil! Foi lançado
originalmente nos EUA em 1989, e juntamente com Misery
e Trocas macabras (outro que não
se encontra mais) representam a fase mais sombria do autor. Sem mais, confiram
o que achei de A metade sombria!
Thad Beaumont começou a escrever aos 11 anos de idade, um
garoto prodígio com um pai agressivo e uma mãe orgulhosa pelo feito do filho,
ter uma história publicada em uma revista. Nesse mesmo ano ele começou a ter
dores de cabeças terríveis e um médico salvou sua vida ao tirar uma espécie de
tumor em seu cérebro. Ele cresceu, e claro, se tornou um escritor.
Hoje aos 39 anos, Thad é um escritor bem
sucedido, casado com uma bela mulher, Elizabeth,
e pai de gêmeos, os bebês William e Wendy. Durante anos Thad publicou alguns
livros que não fizeram muito sucesso, e publicou thrillers violentos sob o
pseudônimo George Stark, livros que
lhe renderam fama e fortuna. Nesses livros, ele narrava as histórias do serial
killer Alex Machine. Ele manteve em segredo o pseudônimo, até que alguém começa
a investigar e ameaça revelar seu segredo. Sem querer ceder ao chantagista,
Thad resolve contar a verdade, de forma teatral em um artigo de
revista. No artigo ele mata e enterra o pseudônimo e promete nunca mais
escrever tais livros.
No entanto, George Stark não aceita ser despachado
para o esquecimento. Afinal, ele garantiu a Thad tudo o que ele tem. E então, desenvolve
um corpo físico e volta a vida para caçar e matar os responsáveis pelo seu
desaparecimento. Os crimes são violentos, deixam sangue e
digitais, digitais que pertencem a Thad. Isso coloca o xerife de Castle Rock, Alan Pangborn, a caça do assassino.
Thad precisa convencer a polícia de
que não é um assassino, e que uma cópia dele, nascido da sua imaginação, criou
vida e está matando pessoas. Stark quer
permanecer vivo, e para isso, Thad precisa escrever.
~~~~~~~
Esse enredo é sinistramente fenomenal! King
arrasa, logo estamos envolvidos com aquela doce família
americana, aqueles gêmeos fofos e aquela esposa de comercial, atormentados pelo
lado sombrio da mente de Thad. George Stark desperta, e o leitor não duvida que
ele seja real, algo saído de uma imaginação tão forte, que toma ares
sobrenaturais, e se torna uma pessoa. Stark é sinistro, forte e um assassino
sem piedade. O leitor teme pela família, teme por Thad e torce por ele. Os
policiais não estão tão dispostos a acreditar que Thad pode ser inocente de um
crime, repleto de suas digitais. Esse é
o cerne da trama.
Paralelamente, eu fiquei refletindo o quanto
Stark era algo físico, e quanto disso vinha da mente sombria do próprio Thad.
Culpado ou inocente? Stark era o reflexo do mal, espelhado nele. Alucinação?
Realidade? Todos os aspectos que permeiam o livro são sombrios. O que a mente é
capaz de fazer? Magistralmente, o autor começa a desconstruir o personagem, que
o leitor simpatizou logo de cara e transforma-o em algo mais obscuro.
Como ponto negativo, acho que só o final não me
ganhou. King tem problemas sérios com finais, quase sempre. Não sei porque
ainda me decepciono rs. Mas foi corrido e terminou muito no ar, eu fiquei
querendo um depois, sobre tudo o que aconteceu com os personagens
(sobreviventes kk). O início foi bem lento, mas depois flui muito bem. Eu
lembro que quando resenhei Outsider
(um dos livros recentes do autor), várias pessoas comentaram que o vilão era
manjado, que já tinha visto aquilo em outros livros do autor. Eu não tinha lido
nada assim ainda e amei Outsider. Nesse, eu percebi as semelhanças, e não me surpreendeu
tanto exatamente por me lembrar do outro livro.
Assim como os outros dois livros que citei
acima, que compõem um período mais sombrio da escrita do autor (lá pelos fins
dos anos 80), esse livro também tem características bem pessoais. Nessa época
sua família sofreu com os abusos do autor, de bebidas e drogas, e de seu “vício”
com a escrita, que tomavam aspectos sinistros, quase como se aparecesse um álter
ego. King usou de inspiração sua experiência pessoal: ele escreveu cinco livros
sob o pseudônimo Richard Bachman.
Porém, com o sucesso de A Maldição, acabou
vazando a informação de que Bachman e King eram a mesma pessoa. Após o
acontecido, King anunciou a morte de seu pseudônimo na dedicatória da
primeira edição de A Metade Sombria,
lançado em 1989 com o título de A metade
negra: “Ao falecido Richard Bachman”.
King deixou muito de si em Thad e George Stark, em Jack Torrance (O
iluminado) e em Paul Sheldon (Misery).
Sinistro não?
Como a maioria dos livros do autor, este também
ganhou uma versão cinematográfica. O livro foi adaptado para o cinema em 1993
com o título de A metade negra.
Dirigido por George A. Romero, tem no
elenco: Timothy Hutton, Amy Madigan,
Julie Harris e Michael Rooker.
Eu confesso que ainda estou aprendendo a gostar
desse lado mais obscuro do autor. Inicialmente simpatizo bem mais com os livros
mais novos e mais leves, adoro Novembro
de 63 e a trilogia
do Bill Hodges. Porém, esses livros mais sinistros tem crescido no meu
conceito, e é impossível negar a qualidade do trabalho do autor.
Se eu indico? King é favorito sempre! Para os
leitores mais maduros e que curtem uma leitura mais pesada, é sempre uma ótima
pedida. Leiam!
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Avaliação (1 a 5):