Vox - Christina Dalcher
>> quarta-feira, 28 de novembro de 2018
DALCHER, Christina. Vox. São Paulo: Editora Arqueiro, 2018. 320p. Titulo original: Vox.
Vox
se tornou parte da minha meta de leitura desde o momento em que anunciaram seu
lançamento no evento da Editora Arqueiro, na Bienal do Livro de São Paulo. A
curiosidade, junto com a minha paixão por distopias, me
deixou desesperada para conhecer a fundo essa história. Agora, divido com vocês
minhas impressões e sentimentos em relação ao livro.
Jean
é uma cientista linguista especializada em deficiências da fala, em especial a
Afasia de Wernicke, que é um tipo de doença que afeta uma parte específica do
cérebro responsável pela fala. Para tratá-la é preciso um soro que foi
descoberto pela equipe da Dra. Jean quando ela ainda trabalhava. Porque agora
ela não pode mais trabalhar. Nenhuma delas pode.
Também
não podem ler, estudar, mas, principalmente, não podem mais falar. Ou até
podem, mas apenas 100 palavras por dia. Para controlar o “falatório” feminino,
cada uma das mulheres recebeu um contador de palavras. É semelhante a um
relógio de pulso e que, conectado à voz de quem o usa, vai contabilizando cada
palavra que é dita. Quando a pessoa alcança a centésima palavra, um leve choque
a avisa que o limite está sendo ultrapassado. Caso não seja obedecido o sinal,
a descarga elétrica que a pessoa recebe vai se intensificando até que perca a
mão, tostada pela eletricidade, ou até mesmo morra, dependendo do tempo que se
mantém sob a descarga elétrica.
Jean
e sua filha Sônia são as únicas da casa que usam a pulseira. O marido e os
outros três filhos, todos homens, estão livres dessa limitação e podem falar e
fazer o que quiserem, desde que não cometam nenhuma heresia, ou também sofrerão
as consequências.
Desde
que o novo presidente assumiu, o país se encontra sob um regime fundamentalista
totalitário. Tudo é baseado na Bíblia. Principalmente na soberania do homem
sobre a mulher, já que Adão foi criado por Deus, e a mulher veio de Adão, e
assim sucessivamente.
Um
belo dia, é noticiado que o irmão do presidente, um de seus homens de maior
confiança no governo, sofreu um acidente e teria sofrido um trauma na cabeça, sendo
diagnosticado exatamente com a afasia de Wernicke. E é então que eles precisam
dos trabalhos da Dra. Jean para que ele seja tratado.
A
princípio ela resiste, mas para aceitar ela impõe algumas condições, que são
aceitas, e uma equipe é formada por Jean, um antigo chefe insuportável e dois
ex-colegas de laboratório: uma grande cientista e um antigo amor de Jean.
Contudo,
ao chegar ao laboratório ela percebe que a coisa não é bem assim, que o buraco
é bem mais embaixo e que o governo está preparando algo grandioso. O que é?
Descubra lendo Vox!
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O
livro é narrado por Jean e, desde o primeiro capítulo, fiquei muito desesperada
com o fato de as mulheres e as crianças do sexo feminino não poderem conversar.
É uma estratégia óbvia, já que desde sempre as mulheres são as que mais falam.
Contudo, elas também são as mais sábias e, desde que se propuseram a alcançar a
igualdade em relação ao trabalho e à educação dos homens, elas se desviaram de
seu propósito e a intenção do novo governo é que elas voltem ao seu propósito
de cuidar da casa e de procriar.
Para
mim que sou mulher foi muito difícil digerir as situações pelas quais passou Jean. Tive vontade de jogar o livro na parede,
de ler em voz alta só para provar que ninguém podia me impedir de falar, de
socar a cara de alguns personagens. Tive que parar, respirar, ficar uns minutos
sem ler, para então voltar e continuar.
Vivi
uma relação de amor e ódio com Jean. De vez em quando, pensava que não teria
coragem de ter determinadas atitudes que ela teve, em outros momentos pensei que
algumas dessas atitudes eram necessárias.
Patrick,
o marido de Jean, acabou se mostrando um cara melhor do que eu esperava. Mas,
até ele tomar uma atitude e mostrar esse lado bom, eu fiquei achando que ele
era um imbecil. Adoro quando me provam que estou errada.
Steven,
o filho mais velho, foi um dos personagens que mais detestei o livro todo, pela
forma de pensar e pelas atitudes. Quanta ingratidão! Mas algumas coisas
acontecem com ele, de modo que posso dizer que me senti vingada.
Os
demais filhos, inclusive Sônia, a garotinha, aparecem pouco, mas ela, quando
aparece, me fez ficar com o coração apertadinho. Os garotinhos são superfofos e
completamente diferentes do irmão mais velho.
O
presidente é uma figura que não aparece, é apenas mencionado. Quem aparece
mesmo é o reverendo que utilizou de seus “poderes” para usar o presidente para
chegar ao poder. No fim das contas, é ele quem comanda a coisa toda. E é
odioso.
O
chefe da equipe que é montada para atuar pelo governo é insuportável. Uma
criança grande pirracenta, aff.
O
final eu achei um pouquinho corrido, ao mesmo tempo que fiquei com muita
vontade de que o livro tivesse continuação. Mas dizem que é livro único, então,
a menos que a autora mude de ideia, vou ficar só na vontade mesmo.
A
mensagem que o livro traz me fez pensar que tudo o que aconteceu é plenamente
possível de acontecer de verdade. Não há aquele pensamento de “ah isso jamais
aconteceria em pleno século 21”. Não. A proximidade com a realidade é muito
grande e poderia acontecer, sim. Basta ter recursos suficientes e gente
influente, e em dois tempos as mulheres estariam de volta às suas casas vivendo
a realidade de donas de casa cuja única função é zelar pelo lar, servir o
marido e procriar.
Possivelmente,
o que o governo encontraria seria uma resistência mais pesada do que encontramos
nas histórias ficcionais, e então o armamento teria que ser ainda mais pesado
para impedir rebeliões e manifestações.
Em
um paralelo com O conto da aia, livro que li recentemente, eu já tinha ouvido
falar nas semelhanças e constatei que elas existem principalmente se você
analisar que em ambas as histórias o regime de governo é totalitarista
fundamentalista. A diferença que encontrei, contudo, foi no fato de Offred, em
O conto da aia, parecer estar mais conformada com a situação em que vive do que
Jean, que usa de todos os meios possíveis para tentar enfrentar o governo e
acabar com as limitações impostas.
Fiquei
com muita curiosidade de saber as impressões que um homem/rapaz/garoto teve/teria
ao ler Vox. Tenho a sensação de que o impacto causado pela história foi
diferente para homens e mulheres, já que elas foram muito mais afetadas no
contexto do que os homens. Se algum rapaz leu, me conte o que achou!
Indico
o livro para todos os que curtem distopia. Se você não acompanha muito o gênero,
acho que é um ótimo jeito de começar. Se já curte, este não deixa a desejar em
relação aos grandes livros do gênero. Leiam!
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(1 a 5): 4,5
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