O quarto de Giovanni - James Baldwin

>>  quarta-feira, 31 de outubro de 2018

BALDWIN, James. O quarto de Giovanni.  São Paulo: Editora Companhia das Letras, 2018. 229 p. Título original: Giovanni’s room.

Houve uma época em que falar sobre homossexualidade ou ser gay era um completo escândalo, causava aversão, ódio, mortes. Mesmo hoje, não é possível dizer que se tenha extinguido por completo os discursos de ódio, as fobias sobre o tema, tampouco que, de repente, todos tenham deixado de lado o que pensam negativamente sobre o tema, para aderir à causa.

Contudo, o que se pode dizer é que a homossexualidade deixou de ser um tema sussurrado para ser tratado de forma mais ampla na televisão e até mesmo nos livros. Este ano mesmo, já li tantos livros com personagens em relacionamentos homoafetivos, que me arrisco a dizer que a contagem não cabe nos dedos de uma mão. E acho muito importante que se escreva mais e mais sobre o assunto e sobre tudo aquilo que as pessoas insistem em não falar sobre, em não se posicionar.

Enfim, esse discurso imenso foi para falar que, graças a essa maior abertura à literatura LGBTQ+, O quarto de Giovanni pôde ser trazido à tona. Um livro escrito por um homem negro e homossexual em uma época em que ser gay era uma verdadeira afronta à sociedade. Um livro assim era considerado lixo, quase heresia, mas jamais literatura.

Sem mais delongas, divido com vocês minhas impressões sobre Giovanni e David e o Quarto de Giovanni.


David é um americano que foi criado com o pai e a tia. Ele é um cara peculiar e já sabe, desde bem jovem, que seria uma decepção para o pai. Isso acabou provocando um distanciamento entre eles.

Na adolescência, David teve sua primeira experiência com um garoto. Já sentia, antes disso, que não gostava exatamente de mulheres. Contudo, David não é exatamente um cara que gosta de se afirmar como gay, e considera que é errado se sentir atraído por outro homem.

Depois do ensino médio, ele se muda para Paris, na década de 50, inventando para o pai que iria estudar e trabalhar. Mas a verdade é que ele vivia de dinheiro que amigos e o próprio pai emprestavam/enviavam para ele. Quando nos é apresentada sua fase adulta, ele está noivo, pasmem, de uma mulher.

Durante uma viagem de sua noiva à Espanha, David conhece Giovanni e se sente total e irremediavelmente apaixonado por ele. Inicialmente acanhado e com medo de sentir algo por outra pessoa do mesmo sexo, David não demonstra muito sentimento. De repente, já está frequentando o quarto de Giovanni e um relacionamento está aflorando entre os dois.

Mas será que David teria coragem de deixar sua noiva para ficar com Giovanni?



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Primeiramente preciso contar que a narrativa alterna entre o presente e o passado de David, e o passado é contado praticamente de trás para frente, iniciando por uma notícia sobre Giovanni que deixa David arrasado e o leitor com uma vontade louca de saber o que houve para que a situação chegasse àquele ponto.

O protagonista David é um cara covarde. Essa é a única palavra que o define para mim. Ainda que a história se passe em uma época em que ser gay era infinitamente mais difícil do que sabemos ser hoje em dia, fato é que os relacionamentos homossexuais existiam. Não digo que desmereço as inseguranças, os pensamentos contraditórios que habitavam a mente de David.  Possivelmente eu teria sentido mais empatia por ele se, em suas atitudes, ele tivesse agido de outra maneira.

Giovanni, por outro lado, é o total oposto de David e me encantou desde o primeiro momento em que aparece na história (acho que todo mundo que o conhece passa por isso de cara, rs). Senti pena e me solidarizei com ele em vários momentos e queria que ele tivesse sido uma pessoa mais feliz do que foi na história (ou acha que foi).

Hella, a namorada/noiva de David, é a figura que representa todo o machismo e submissão feminina da época. Para relembrar que naquele tempo não era apenas a homossexualidade que era oprimida. As mulheres, também.

A narrativa não tem um grande ápice na minha opinião. Achei um pouco previsível o que aconteceu, se você parar e analisar todo o contexto.

O desfecho, que finalmente nos revela o grande segredo que vem nos instigando ao longo da história, acabou por ser, na verdade, a confirmação de todos os pensamentos que tive sobre David ao longo da leitura, ainda que  ele não esteja envolvido diretamente na situação em si.

E, assim, ainda estou remoendo dolorosamente a dúvida sobre se o misto de sentimentos ao longo do livro foi para mim uma coisa boa ou ruim.

Em relação ao título, posso dizer que, além de existir realmente um quarto na história, você pode interpretá-lo como uma metáfora do receio do protagonista em relação a “sair do armário”, o que também é plenamente aceitável.

Indico para quem gosta de romance LGBTQ+, para quem gosta de literatura mais densa e para quem quer ler mais sobre o tema.


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