Viagens da Alice #2
>> quinta-feira, 4 de maio de 2017
Depois da
tentativa de contar para vocês mais sobre meu chihuahua ranzinza, passei uns
dias apertados no trabalho e depois focada nas resenhas. Agora, devidamente de
férias, dá para contar a história de como o amor da minha vida chegou até a
minha casa.
Meu
chihuahua está registrado com o nome Dom Peri di Steissen Bertucci. Hoje ele
mora comigo e minha mãe, mas tecnicamente ele é da minha irmã. Tecnicamente porque foi o dinheiro dela que pagou a compra do filhote da única raça que minha
mãe aceitou ter em casa. E até que não foi tanto dinheiro assim, pois o herói
da nossa história é um cachorrinho de liquidação, e o melhor ainda, um
cachorrinho de liquidação do Mercado
Livre!
Quando
recebemos o aval para ter um cachorro em casa, levei muito a sério o trabalho
de pesquisar e me preparar. Foram 19 anos de espera, e queria que todo esse
tempo valesse a pena. Foram dias, semanas, minutos e horas de pesquisa,
conversa com donos de animais, criadores, veterinários, inúmeros criadores, pet
shops e sites visitados. Nesse período, o Encantador
de Cães Cesar Milan virou meu
herói e meu programa favorito, e ficamos entre duas raças: Buldogue Francês e
Chihuahua.
O problema é
que não encontrávamos um buldogue por um valor menor que um órgão de uma
criança virgem de sangue azul, e quando deparei com um anúncio no Mercado Livre
de um criador no Rio de Janeiro vendendo chihuahuas por ¼ do preço normal, não
perdi a oportunidade. Foram dias de conversa, negociação e desvios dos raivosos
criadores da raça, que reclamaram do preço barato que desvaloriza a criação (se
você pensar bem, o quilo de um chihuahua filhote é mais caro que o quilo do
ouro), até que fiz um lance que me proporcionou conversar melhor com o criador
e entender por que os cachorros estavam em liquidação.
O meu medo
era comprar gato por lebre – ou melhor, Pinscher por Chihuahua – por isso
tomamos toda cautela do mundo. Acontece que o criador estava trocando de raças,
e precisava do espaço. E foi assim que o negócio foi fechado e no dia seguinte,
um cachorrinho de 2 meses e 800 gramas nascido em Botafogo, no Rio de Janeiro,
embarcava num voo da Gol para o terminal de carga de Confins, onde eu o
esperava.
Lembro
direitinho do dia: foi quando aprendi onde fica o terminal de carga do
aeroporto de Confins. Esperei mais de uma hora em pé, pois a estrutura ali é
bem precária, até que meu cachorrinho veio numa caixinha de madeira, com
atestados e certidões em envelopes. Ao me entregar o menor cachorro que já
tinha visto na minha vida, o funcionário riu, e ao perguntar o motivo, fui
informada que no mesmo voo que o Peri vieram 1 gato e 3 galos. Provavelmente o
bagageiro do avião virou uma encenação de A Revolução dos Bichos, com os galos tomando
o lugar dos Porcos, um dos motivos pelo qual hoje é limitado a 2 o número de
animais transportados por voo. Pensando bem, talvez esse seja o motivo do Peri
não se relacionar com outros animais – trauma de infância.
Ele era
muito pequeno – pesava 800 gramas em seus 2 meses de vida. Fiquei preocupada
com a hidratação dele, e ofereci água, que ele recusou. Já imaginei que estava
doente, mas hoje, 11 anos depois, sei que o Peri detesta água: só bebe quando
está prestes a desmaiar de sede, não toma chuva, não pisa em poças e banho...
nem se fala. Após isso, foi pegar um táxi e chegar em casa, para os braços da
mãe dele, que já me ligava ansiosa.
(Queria
dedicar esse parágrafo ao motorista daquele táxi, o carro que trouxe o Peri de
Confins até o bairro Santo Antônio, em Belo Horizonte. Não lembro mais seu
nome, mas você foi muito simpático, aceitou o animal no seu carro – mesmo ele
estando na caixinha lacrada. E o que você ganhou em troca? Ele fez xixi, a
caixinha vazou e molhou seu banco inteirinho. Eu peço desculpas, pois fingi que
não vi e saí de fininho, e esta é a primeira vez que conto do ocorrido. Você
deve ter gasto um bom dinheiro para limpar seu banco, e eu não falei nada, nem
pedi desculpas. Desde então, eu sempre deixo um dinheiro a mais com taxistas, e
gosto de pensar que minha dívida está paga. Mas mesmo assim, desculpas. Eu era
mãe de primeira viagem, entende...)
Em casa,
abrimos a caixa e liberamos nosso pequeno chihuahua, que chamamos Peri. O nome
já indica que minha casa é uma casa amiga dos livros, e o herói índio de O
Guarani de José de Alencar foi representado. Peri nunca teve uma Ceci, mas teve
uma Lassie e uma Clarisse, ursinhos de pelúcia que funcionam como amante dele.
Mas enfim, um nome literário e especial para um animal muito esperado!
Dormiu o
primeiro mês de sua vida de baixo da máquina de lavar roupa, e só aprendeu o
lugar das necessidades fisiológicas depois de quase 8 meses. Assustava o seu
tamanho, tanto que a primeira coisa que minha mãe disse quando o viu foi
“Nossa, ele é muito pequeno! Eu vou pisar nele”. Nunca pisamos: ele sempre foi
muito ágil, como forma de compensar seu tamanho. Era engraçado o fato dele
andar como um Manga Larga Marchador, trotando pela casa, e depois pela rua,
quando sempre parou e ainda para pessoas para ver, apontar, rir e tirar fotos.
Começou com espaço limitado, e hoje é dono da casa. Tinha todos os
brinquedos do mundo, mas só um ficou: o que não era brinquedo, mas meu ursinho
de pelúcia, um Scooby doo que logo perdi.
E
aí nosso pequeno cachorrinho foi mostrando sua identidade e suas
características.
Peri adora
cenoura, mas só cozida. Peri adora tomate, mas somente se não tiver caroço.
Peri gosta de brincar de perseguição, mas se você o pegar, ele fica bravo e a
brincadeira acaba. Peri só faz xixi em jornal limpo. Peri te chama para dormir.
Peri sabe encaixar a cabeça dentro da coleira. Peri só pede para dormir na cama
com você quando está doente, e se você muda de posição quando ele está
confortável, ele rosna e até morde. Se você dorme numa posição não boa para
ele, Peri o arranhará até te acordar para você mudar de posição. Peri ama
passear, e dá cerca de 5 voltas no próprio corpo antes de se aliviar. Peri está
velhinho, é cardíaco e precisa de cuidados constantes. Peri vê quando você está
chorando e sobe no seu colo e literalmente enxuga suas lágrimas, com lambidas.
Peri vê quando você está triste e deita do seu lado, e até deixa você fazer
carinho nele. Peri é bravo. Peri tem um bom coração. Peri é o melhor cachorro
que a minha família poderia ter.
Peri não
gosta de colo e não gosta de carinho. Ele não gosta que encostem nele, e logo
aprendeu a se comunicar. Fazemos a pergunta: se a resposta é sim, o rabo abana.
Se é não, ele mostra os dentes:
E assim foi,
ele nos guiando, as regras sendo estabelecidas, e uma relação de amor marcada.
Uma relação marcada com sorrisos ranzinzas, latidos, mordidas, mas muito, muito
amor.
Com o tempo,
minha irmã – a mãe dele – se mudou para São Paulo, segundo ela para dar uma
vida melhor ao filho, que ficou para ser criado pela tia e os avós. E o Peri
ficou assim, meu sobrinho, meu filho, meu eterno companheiro.
Não estou
nem brincando quando digo que minha monografia da faculdade foi dedicada a ele.
Durante todos os dias que gastei escrevendo e estudando, ele ficou o tempo
inteiro ao meu lado. Quando não aguentava mais escrever ou estudar, passeava
com ele até a mente voltar ao normal. Quando as palavras não saiam, era com ele
que falava das minhas dúvidas e problemas. E quando terminei, foi com ele que pulei
e comemorei (embora ele tenha tentado morder meu joelho, pois não gosta de
bagunça).
Eu devo
muito a meu animalzinho. Meu cachorro de liquidação, carioca, de Botafogo, que
foi a primeira e única compra que até hoje fiz no Mercado Livre.
Valeu a pena.
(Dom Peri Di
Steissen Bertucci, mais conhecido como Peri, também atende pelo nome de
Perigoso. Suas Peripécias são sempre registrada no instagram @alicebertucci.
Peri hoje pesa 2,2kg, tem 11 anos e mora no bairro Santo Antônio, em Belo
Horizonte. Ele detesta futebol, sua comida favorita é pão de queijo e seu
melhor amigo é um Scooby doo de pelúcia. Ele é bravo, mas amoroso, e
agradece a todos vocês por ler sua história)