A herança - John Grisham
>> segunda-feira, 4 de maio de 2015
GRISHAM, John. A herança. Rio de Janeiro: Editora Rocco, 2014.
(Jake Brigance, v.2). Título original: Sycamore Row.
“Quero que este testamento seja defendido
a todo custo e sei que o senhor pode fazê-lo. Especificamente, deixo de fora
dele meus dois filhos adultos, seus filhos e minhas duas ex-esposas. Não são
pessoas boas e vão lutar, portanto prepare-se. Meu patrimônio é substancial - eles
não têm ideia do tamanho – e, quando isso vier à tona, eles vão atacar. Lute
contra eles Dr. Brigance, até o fim. Nós temos que prevalecer.” p.30
Quem leu Tempo
de matar, ou assistiu ao filme, já conhece alguns dos personagens dessa
história, principalmente, o destemido advogado Jake Brigance. Vinte anos após a publicação, os fãs do autor não esperavam por uma continuação e ficaram em polvorosa. O
rei dos thrillers jurídicos, John Grisham, volta a Clanton para mais um atribulado julgamento com A herança.
Essa resenha não
contem spoilers sobre Tempo
de matar, mas não deixe de ler
o livro anterior antes deste. A herança conta muito da outra história, uma forma de
relembrar o leitor dos acontecimentos passados.
Três anos se passaram
em Clanton, Mississippi. O então jovem advogado Jack Brigance, tornou-se famoso durante um julgamento de homicídio
que parou o Estado. O mais infame homicídio racial da história da cidade. Em
1988 Jake não é mais tão novo assim, agora tem certa experiência, mas ainda
não se recuperou dos problemas do passado. Está quebrado, seus clientes não
têm dinheiro, seus casos são simples e não rendem muito.
Tudo muda quando Jake
recebe uma carta, uma carta de um homem morto. Seth Hubbard, 71 anos, estava morrendo
lentamente de câncer, quando os médicos dizem que o tratamento só irá adiar o
fim, resolve se matar. Planeja tudo muito bem, deixa até as instruções para
seu enterro. Além disso, elabora uma carta, instituindo Jake como advogado do
seu espólio. Na carta renega seu testamento anterior e avisa que a briga
será grande, que Jake deverá brigar até o fim para garantir que seu novo
testamento seja válido.
“Tenho dois filhos – Hershel Hubbard e
Ramona Hubbard Dafoe – e eles têm filhos, embora eu não saiba quantos, pois não
os vejo há algum tempo. Excluo ambos os meus filhos, espeficamente, e todos os
meus netos de qualquer herança do meu patrimônio. Eles não receberão nada. Não
sei os termos legais necessários para “excluir” uma pessoa de uma herança, mas
minha intenção, aqui, é proibi-los completamente – meus filhos e netos – de receberem
qualquer coisa de mim.” p.32
Além de deserdar toda
a família, Seth deixa 90% de sua herança, que depois virá a ser estimada em
mais de 20 milhões de dólares, para sua empregada negra, Lettie Lang. Começa então o maior julgamento da história da
contestação, com os filhos lutando para invalidar o último testamento, escrito
a mão, que deixa toda a família de fora e dá tudo para uma simples empregada
negra.
~~~~~~
O racismo no sul dos
Estados Unidos é um assunto muito abordado pelo autor, sempre de forma
brilhante. Aqui mais uma vez temos dois lados, os negros torcendo por Lettie e
Jake querendo garantir a vontade de Seth. Enquanto os brancos acham um absurdo
uma negra herdar tanto dinheiro, tirando tudo das mãos da família branca.
Lettie será acusada, ridicularizada, todos querem saber o que fez Seth fazer
tamanha loucura. E ninguém sabe, o testamento não diz, Lettie não sabe, ou diz
não saber.
O livro é narrado em
terceira pessoa com um diferencial, o autor utiliza aquele “narrador
onisciente”, que muitas vezes já adianta o que vem a seguir. Com frases que faz
o leitor se descabelar como “e eles não imaginariam o que viria a seguir” ou “e
tudo desmoronaria em poucas horas” rs. O autor tem uma
narrativa brilhante, que me prendeu do início ao fim. Eu não fazia ideia do que
iria acontecer, em como tudo poderia terminar.
Os personagens são
excelentes! Jake já era um queridinho do livro anterior, o xerife Ozzie está de
volta, o promotor do caso anterior Rush continua um pé no saco. E o povo da cidade em geral,
os fofoqueiros de plantão, o louco do Lucien, os advogados amigos de Jake, a
turma está todo lá, como acontece em todas as pequenas cidades. Temos muitos
personagens novos, o núcleo todo envolvido no julgamento.
O julgamento em si é
muito interessante, no livro anterior o leitor tinha um lado certo pelo qual
torcer, sem sombra de dúvida. Aqui, apesar de sempre torcermos pelo lado de Jake
e pelo fim do preconceito, há aquela linha de pensamento, onde todo mundo para
e pensa se é injusto o pai não deixar nada para a família, mesmo os filhos
sendo dois bostas hehe.
O autor choca o leitor
com o racismo no Mississipi, o julgamento agora já ocorre em 1988/89, mas o
autor deixa claro que as coisas não melhoraram, que a cabeça dos homens agora e
no passado, entre as décadas de 30 e 60, continua muito forte. Mesmo após o fim
da segregação, manteve-se a separação entre negros e brancos nas
pequenas cidades. Um dos muitos exemplos citados no livro, os brancos ficam revoltados porque uma
família negra compra uma casa que era de um branco, falando que vai
desvalorizar todo o bairro. Agora imaginem, um júri praticamente todo branco,
conceder a uma negra uma herança que fará dela a mulher mais rica da cidade?
O circo está armado e
mais uma vez aplaudo o autor de pé. Só não dei 5 porque achei o final, pós julgamento, muito corrido. Também porque queria que alguns personagens sofressem mais hehe. Queria saber de
mais algumas coisas e o autor não mostrou nada.
De qualquer forma é um
livrão, amo thriller jurídico e o autor arrasa. Para quem gosta do estilo ou
quer conhecer o John Grisham é uma ótima pedida. Leiam!
Jake Brigance do John Grisham
- Tempo de matar (A time to kill)
- A herança (Sycamore Row)
- Tempo de perdoar (A time to mercy)
Avaliação (1
a 5): 4.5